Durante Sessão Solene que lhe outorgou o título de cidadão baiano, Ariano Suassuna, autor do renomado e premiado da obra O Auto da Compadecida, reconheceu que o discurso de que o Brasil é um país miscigenado, apaga a identidade da comunidade negra e mascara o racismo que existe no país. A vereadora Olívia Santana estava presente na Sessão e representou a Câmara Municipal de Salvador.
Nascido em 16 de junho de 1927, na cidade de João Pessoa, Paraíba, o escritor e teatrólogo Ariano Suassuna tornou-se cidadão baiano, nesta quinta-feira (10). Autor de diversos livros, contos e peças teatrais, como o Casamento Suspeitoso e o Auto da Compadecida, Ariano é agora o mais novo conterrâneo de escritores como Euclides da Cunha, Castro Alves e Gregório de Mattos. Sobre este último fez uma série de elogios lembrando que por toda a sua capacidade de crítica tenaz à sociedade, especialmente, à elite política da época ficou consagrado como "Boca do inferno". Entretanto, Ariano, com seu jeito todo coloquial de falar sobre as coisas, disse de maneira muito indignada que infelizmente tinha que reconhecer que Gregório de Matos era racista.
Suassuna fez a afirmação em relação ao racismo de Gregório de Mattos, ilustrando com a leitura de um trecho da poesia "A huma freira que impedio a outra mandar um vermelho ao poeta de presente, dizendo que à havia satyrizar". Na poesia, Gregório se revela irritado porque uma freira impediu a outra freira de mandar-lhe um peixe vermelho, que ele queria muito receber. Diz um verso da poesia: "Assim como o vosso conselho perdi eu o meu vermelho, percai vós a virgindade: que vo-la arrebate um frade; mas isto que praga é? Praza ao demo, que um cobé vos plante tal mangará que parais um paiaiá, mais negro do que um guiné". Ou seja, a praga que ele jogava contra a freira é que ela tivesse um filho negro.
Ao repetir esse verso, Suassuna contou à platéia um pouco da sua própria história de vida e sobre como se convenceu de que a miscigenação brasileira não resolveu o problema do racismo, como ele sempre imaginara. "Quando o IBGE resolveu realizar o senso, incluindo o quesito cor. Muitos afirmaram que isso iria dividir o Brasil, pois éramos todos misturados. De um lado tínhamos Gilberto Freire que insistia na sua posição de uma nação miscigenada e do outro lado o Movimento Negro que afirmava que o discurso da mestiçagem apagava a identidade dos negros e mascarava o racismo vivido no cotidiano. Eu preferi, deste dia em diante, ouvir o movimento negro. Fui convertido da idéia de que existia não existia racismo no Brasil, por isso resolveu mudei o símbolo que sempre usei para representar a nação Brasileira, que era uma onça castanha, para uma onça malhada", declarou o homenageado.
Presidente da Comissão de Educação e Cultura, a vereadora Olívia Santana, representou a Câmara Municipal de Salvador na Sessão e parabenizou o escritor e teatrólogo Ariano Suassuna pela sua visão crítica das obras de Gregório de Matos e de Gilberto Freire e declarou ser um presente participar de uma sessão tão forte que homenageia uma pessoa tão simples e ao mesmo tempo intensa como o escritor. "Fiquei impressionada com Ariano. Gosto muito da sua obra e da pessoa que ele é. Suassuna expressa muito bem o sentimento nordestino. Mas, o que me emocionou mais foi ouvir a maneira como ele falou sobre o racismo presente na obra de seus colegas escritores consagrados e sobre a maneira como ele passou a compreender a justeza da luta de todos nós, negras e negros. Também achei linda a forma apaixonada e cuidadosa como ele se referia a sua esposa. Um homem de 80 anos, muito à frente do seu tempo", declarou a vereadora.
Ariano Suassuana, demonstrou ser unanimidade entre todos os parlamentares presentes na Sessão Solene. Entrou no plenário da Assembléia, ladeado por deputados de diversos partidos, como: Álvaro Gomes (PC do B), Gilberto Brito (PR) e Zé Neto (PT). O título foi concedido ao escritor através de uma iniciativa do Deputado Estadual Paulo Rangel.
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